Não sei se fui eu quem decidiu seguir na música. Acho que decidiram por mim.
Sim, porque a música estava em mim desde criança, é fato. Mas daí a decidir dedicar-se a uma carreira musical é outra coisa.
Eu trabalhava como garçom, há uns 11 anos, e a grana não sobrava nem para comprar uma palheta. Mas emprestava o violão do vizinho, e com ele fazia algumas composições.
Um dia, no meu trabalho, eu estava atendendo dois clientes: a dona Luzia e o seu Edson, marido dela. Então eu disse pra ela:
– Dona Luzia, minha mãe está vendendo lingerie. Se resolver comprar, fale comigo.
– Ah é? Então me passe o telefone dela.
Dona Luzia ia quase todos os dias onde eu trabalhava. Mas era a primeira vez que eu puxava um assunto diferente, mais pessoal. Ela tinha bom humor, e de vez em quando me dava gorjetas. Passei o número do telefone da minha mãe para ela e, no dia seguinte, soube que ela havia ligado, e elas se encontraram.
De noite, assim que eu comecei a trabalhar, dona Luzia me chamou e protestou:
– Por que você não me disse que cantava?
Eu fiquei um pouco confuso, mas logo entendi. As mães, quando reúnem-se, adoram falar das qualidades de seus filhos.
– A minha mãe andou falando de mim, é? – Perguntei, sorrindo.
– Ela disse que você canta desde criança e que escreve músicas também.
– É , eu tento né! – Concordei meio sem jeito.
– Pois neste sábado vou na sua casa ouvir você cantar.
– Ah, que legal! Será muito bem vinda.
– Então estamos combinados!
Dona Luzia era assim, pensava, combinava e ponto final. Fui entender melhor isso mais tarde.
No sábado daquela semana, ela e seu Edson foram até minha casa. Eu emprestei o violão do vizinho e mostrei algumas músicas para ela. Eles ouviram, depois ela conversou um pouco com minha mãe, que morava em uma casa ao lado da minha, e não me disse nada. Nem se as músicas eram bonitas ou feias. Ficou mais alguns minutos e foi embora. Eu lembro de ter dito para minha mãe: “Estranho, ela não falou nada das músicas. Acho que não gostou.”
No dia seguinte, no meu trabalho, dona Luzia e seu Edson entraram no estabelecimento e me chamaram.
– Tudo bem, Ronaldo? – Disse ela.
– Tudo, sim. E com a senhora?
Mas ela não me respondeu, e começou a falar.
– Ronaldo, eu não falei nada sobre as suas músicas ontem porque queria falar com meu marido primeiro, para saber se ele teve a mesma impressão que eu. – O seu Edson olhava fixamente para meus olhos. – Nós ouvimos suas músicas com atenção.
– Que bom, dona Luzia, gostaram? – Eu perguntei, já meio nervoso com a resposta.
– Sim. E mais, quero que você vá numa loja amanhã e escolha o violão que quiser que eu vou te dar de presente. Sua mãe disse que aquele violão não é seu.
Eu não acreditava no que estava ouvindo. Depois de muito agradecer, fui para a cozinha, me ajoelhei e chorei.